terça-feira, 16 de março de 2010

Percepção em movimento

Estranhos passam os dias
Somos todos resquícios
Da mesma velha melodia
Somos simples auspícios
De que as coisas venham a melhorar
A viagem os passos e os sonhos
Não podem nunca parar

O que resta

Passado o tempo
assado em mente

Nos debatemos
com as ilusões de futuro
que sempre
acabam em nada

Sentido o beijo
Passado o desejo

Só o que resta é estrada

Para ela

No segundo em que
nossos olhos praticaram
uma mutúa transfusão de alma
Inflei os pulmões
Agora renovados e floridos
Pelo desabrochar
corrosivo da paixão
E soube
que conhecia aquele olhar
havia mais de mil anos

Daquele momento
em diante
Só que me pertubava
era o instante
Em que de minha boca
saltariam certeiras
As herméticas
palavras ligeiras
Para declaração
de entrega à vida

Anedota da deserção

A vida
com seus acordes de entardecer
passou em mim
tão perto
que já não sei

há dias o que se passa

São boatos que o fato
Aproveitou-se
do lusco-fusco entardecer

para desertar da realidade

A um poeta de Sanfona

"a João Pedro"

Amigo, teus braços
que desabrocham
melodias
do escuro silêncio da sanfona

Amigo, teus braços
que ponteiam
encantamentos
no limiar sereno do peito

Não param

Seus ritmos
de inspirado concertista do ar
ressoam animam encantam
a festa que não pode parar

Nos sussurros
Harmônicos do vento
Os poetas de alma sem momento
como ti

Se vestem da canção
eterna
Revelam com apenas
um acorde

um glorioso olhar de artista

Quando...

Quando
Tudo é a toa
a gente nada
a gente voa

Poética IV

es(se) mover pelo mundo
farejando
um segundo

Sou vida
(in) verso
em madrugadas
disperso

Vento clownesco

Palhaços russos
de capote em preto e branco
Passos bruscos
em neve semovente

num denso olhar
de noite escura
mil sorrisos
florescem

Pergunta

O que é a tristeza
senão
o lamento da alegria?

Só o que o posso

São tantos copos descartáveis
mirando o vazio para o outro lado da rua
tantos musgos limos e limbos
desabrochando
seu verde ventre triste
em meio às pedras sujas

Que enquanto o céu nos libera
em seu manto de azul ausência
Só o que posso é distrair-me
No branco vôo estranho
de uma lunática garça urbana
durante as claras horas da manhâ

Descascando Palavras

A primeira casca
da palavra
caiu sem revelar-me

seu gosto

tive que seduzi-la
semi-nua
para ter um vislumbre

suposto

de seu
despudor semântico